quinta-feira, 4 de maio de 2017

Bad blocks: porque não caçar bons sentimentos em locais bad feelings

A partir de um certo ponto, não há retorno. Este é
o ponto que é preciso alcançar
.
(KAFKA, Franz)

 

Bad blocks


Viver é acumular experiências e por diversas vezes elas não são apenas boas. Grandes momentos podem ser recheados de bad vibes. Ah, mas o inverso também procede: Bad vibes podem ser recheadas de grandes momentos.

O que marca, guardamos na memória. E há um perigo de que se torne um bad block. E aqui vai uma explicaçãozinha (quase desnecessária) nerd e me desculpe por começar dessa forma

Um bad block é o que acontece com o HD (disco rígido) do seu PC quando há um setor defeituoso, que pode ter uma causa física (hardware) ou por conta de uma programação (software).

Você sabe que o HD, explicando de modo bem grosseiro, serve para gravar programas, documentos, fotografias, vídeos e etc. Mas, antes que isso pareça um tutorial tech sobre hardware e software vamos ao foco do tema:

Bad blocks, em nossas vidas, são pedaços do nosso contexto histórico, que por algum motivo foram danificados. Geralmente por super bad vibes, ou seja, experiências bem ruins, mesmo com pessoas ou coisas que deveriam ser boas.

Planos que não deram certo, pequenas e grandes tristezas, aqueles momentos que feriram as expectativas, os erros, fracassos... 

O emprego perdido, dívidas, fim de relacionamento, aquela pessoa que você amava loucamente e hoje finge que não te conhece, incompreensão, pequenas injustiças and going down, down, down...

Bad block
 

Aquele momento na sua mente, no seu HD, que apesar de ter sido incrivelmente bom, tem pontuações tão ruins que só de acessá-lo te joga numa tristeza tão pesada... e no final das contas, você não consegue entender exatamente o porquê.

Com o tempo, essas lembranças vão se tornando tão insuportáveis que você acaba por transformá-las num bad block. O local fica estéril, inacessível, não é possível guardar mais nada por lá. Dessensibilizando tudo o que for relacionado com aquele sentimento.

E isso é foda ruim demais, porque vai te desumanizando gradativamente. 

Existem duas formas comuns de adquirir bad blocks: por uma tendência física e/ou uma psicológica. Parecido com o mundo dos PCs, né? Tipo, problema de hardware e de software e tals?  Algumas pessoas nascem com a propensão a desenvolvê-los (por distúrbios químicos). Outras pessoas acabam, por uma condição emocional, a formá-los. 

Sintomas 

Se já houver um bad block na sua vida, não é fácil dizer se ele vai se alastrar para outros setores e torná-lo mais desapegado da essência das próximas experiências. No geral, a total falta de vontade de participar ou fazer coisas que te inspiravam alegria, quando estão relacionadas com aquele setor afetado, já é um sintoma de que ali há um problema.

Quando isso é de origem física, ou seja, um distúrbio químico que provoca a dissociação e prejudica completamente a relação com o mundo e até mesmo consigo, o certo é procurar uma ajuda especializada. 


Não há controle. Vem sem avisar e de repente, já foi. Provavelmente, quem tem essa barreira de ordem física faz (fará) uso de medicamentos e é (será) acompanhado de perto por um profissional.

Há o lado de quem procura revisitar bons sentimentos em locais bad feelings. Voltar nas lembranças de quando tudo eram flores para ter uma experiência de reviver a sensação, parece uma boa coisa. Mas, é impossível desassociar tudo o que aconteceu. 

A ciência explica que relembrar coisas passadas, trás de volta todas as emoções daquele momento. Explica também que dores emocionais se tornam físicas. Explica mais ainda: recorrer aos traumas causa problemas viscerais que podem acompanhar por toda a vida.

A mente de algumas pessoas acaba suprimindo a dor daqueles sentimentos e não mais lembrando dos momentos vividos. É uma técnica de defesa. Outras pessoas, de tanto recorrer às bad feelings para lembrar dos bons momentos, acabam por espalhar os bad blocks para outras instâncias dos sentimentos. Fazendo com que a sensibilidade se vá. Não há mais o que acessar ali.

Reprogramando

É difícil, mas não é impossível tratar setores danificados. Não viver no passado é uma forma de iniciar a reprogramação desse quadro. Verificar exatamente quais momentos causam vibes ruins e não permanecer neles, mas sim compreender que o tempo passou e que você não é a mesma pessoa do passado, nem o resultado que ficou para trás, nem o término do relacionamento, nem a opinião do outro, nem a mágoa sentida ou causada... e tantos outros momentos que te travam na cama e te fazem perguntar qual o sentido de sua existência na vida é o primeiro e mais importante passo.

O segundo e definitivo é resistir à tentação de se sabotar. É um processo de atualização que demora. Visitar esses setores é viciante. Mas recondicionar a mente é possível e preciso. Não esquentar a cabeça com coisas menores e procurar atividades mais light

E por fim, procurar encontrar a alegria em outro lugar. Em pessoas que te mostrem exatamente o contrário do que a memória ruim te condena. Assistir filmes com good vibes. E procurar não se vangloriar do mal que você sente.

Não somos feitos de pedaços. Nem podemos trocar nossos HDs quando bem entendemos por um mais espaçoso e adicionar pentes de memória que nos façam rodar melhor.

Mas, diferente de uma máquina, somos orgânicos e há a possibilidade da regeneração das áreas mais afetadas, mesmo pelos bad blocks. Não rola caçar bons sentimentos em locais bad feelings

Correr o risco de deletar um pedaço importante de si e não permitir se deixar marcar por mais nada tão relevante quanto (ou até mais), por estar preso no passado. Dessensibilizar a alma. Criar calos no sentimento até nada mais existir. Afetar as áreas vizinhas. Desumanizar.

Criar black blocks é a prevalência do robotizar.

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