Filosofia in loco: eles passam |
Vã Filosofia
Na vida tudo é passageiro, menos o motorista e o cobrador.
[pausa dramática para deglutir a piada]
~sonzinho de virada de bateria *ba dum tiss* sacramentando~
Provavelmente você já deve ter lido. Ou mesmo, ouvido isso em alguma roda de amigos, num churrasco com a família, numa conversa paralela ou mesmo de um motorista ou cobrador (ou trocador, wherever); sempre há um comediante que se arrisca.
Sem graça, né? Piada que faz rir quando criança e olhe lá. Mas, ninguém perde a chance do trocadilho. Mesmo com a certeza do “que merda!” geral, lá vai um engraçado e solta a pérola. Desde ontem (uma quarta-feira de Setembro), enquanto analisava a relação que os condutores de ônibus (a maioria) têm com os seus passageiros – levando em consideração O Processo, de Franz Kafka, naquela avaliação sobre o poder que o porteiro pensa possuir sobre a vida do outro – e que na maioria das vezes, tem (a gente aceita, né?).
O porteiro acredita possui o poder de decidir o destino das pessoas |
De várias inferências que desenvolvi da leitura desse clássico a melhor foi aquela que todos estão cansados de saber (olha que coisa!): as pessoas valorizam demais a sensação de poder (mesmo que falsa). Seja possuí-la, seja partilha-la, seja presenciá-la.
Depois de um destempero com um motorista de ônibus, pensei no quanto somos trouxas. Por exemplo: já experimentou pedir perdão? Mas pedir de coração, mesmo. É quase tangível a tensão que é criada. A expectativa como uma bola no estômago. A sofreguidão durante a espera. O poder de perdoar concedido a alguém. E muitas vezes esse alguém vai se deliciar com os teus momentos de submissão. É como se possuísse o controle sobre a vida alheia. “Não sei...”, “...pensa que é fácil, fazer e depois só pedir desculpas?”, “Conversamos depois...” entre outras, só pelo prazer de fazer o solicitante sentir-se menor; aquela massagem desnecessária ao ego do solicitado.
“Dai poder a uma pessoa e descobriras quem ela realmente é” |
Contadores de vantagem se sentirão donos do mundo em mesas de bar ou lugares afins “Neguei a entrada de um véio lá! Ah, toda vez vem pegar meu carro, vai em outro! Meu carro não é museu!”, que no final das contas só serve para apodrecer a alma. Enfim, alusões à parte, lembrando de Kafka, do porteiro, e avaliando os caras que se comportam como imbecis por acreditarem ter o poder, lembrei da piada. E tive outro insight filosófico.
“... Menos o motorista e o cobrador...” E foi lembrando de todos os bom dias, boa tardes e boa noites e das poucas vezes que travei diálogo com um profissional ou outro (e depois de mil fichas caírem) pensei: ainda bem que temos outros pontos de vista para avaliar. Focarei em dois contrapontos.
Para o coletivo e para os transitórios a figura do condutor e do trocador é sólida – imutável. Seja eles quem forem. São pessoas comuns que tem o status atribuído pelos demais como donos constantes.
Aos olhos de quem caminha, na rua mesmo, todos são passageiros. Não há importância, não há um que não seja efêmero. É a visão de quem está do lado de fora do processo, sem envolvimento. A visão orgânica de que todas as coisas permanecem em movimento e que, em determinado momento se desfarão ou se transformarão.
Aos olhos de um visionário, o exterior do coletivo também é passageiro |
Daí, começo o dia de hoje com a convicção (que talvez mude, afinal não sou dono da razão) de que o poder não é imperativo para a felicidade. Imutável só a perfeição e ela não existe entre nós. Viver é metamorfosear-se.
Na vida tudo é passageiro, seja motorista, seja cobrador.
by J, 55th Rebel
Nenhum comentário:
Postar um comentário