segunda-feira, 22 de junho de 2015

Crônicas do Frio (22) - O Realismo Fantástico

O Realismo Fantástico 
  • (Aviso: Violência, Referência Sexual, Horror)
  • [P.S: Impróprio para pessoas que tenham mente fértil feat. nojo]
  • {P.P.S: É  sério. Depois diz que não foi avisado(a)}

O Julgo



Uma noite fria de setembro, aquela. Robert Stoneshoulders caminhava calmamente pelas calçadas da sombria Newlake´s Valley. O vento constante e uivante acompanhado por uma névoa célere e rastejante tornavam o clima mais sinistro do que já poderia ser. As ruas pavimentadas transpiravam um ar misterioso e macabro... Cada prédio ou construção, à noite, transformava-se – juntamente com a projeção de suas sombras - em monstros de diversos aspectos em seu silêncio doentio e ao mesmo tempo avassalador. Ao entrar em contato com o duro piso da calçada e por vezes do asfalto meio-molhado, os sapatos sócio-espotivo pretos de Robert faziam ecoar e retumbar por todo um quarteirão o som de sua passagem.

Com sua beca “paletó e gravata” desarrumada e seus cabelos assanhados, o Dr. Stoneshoulders (que mesmo não possuindo doutorado, nem sendo médico ostentava tal título) trazia em seu bafo alcoólico – e num perfume barato que se mesclava ao seu Jandoire – a prova de que estivera numa festa ou confraternização pessoal. O cheiro de sexo exalava de seu corpo.


Ele, apenas, abriu um sorriso majestoso – que era uma de suas qualidades cativantes e manipuladoras – ao lembrar de como sua noite havia sido ímpar. Não se importava em ter ludibriado e manipulado o vice-presidente da AFIYHE (All Fantasies In Your Hands Entertainments), muito menos de ter causado seu suicídio quando conseguiu a vice-presidência por meio da lascívia da esposa dele  a presidente da empresa , ou ainda de ter batido com o Corvette amarelo e preto de 180.000 U$ há apenas alguns minutos e de ter sido o único sobrevivente de tal acontecimento por só ele estar utilizando a segurança disponível (não era culpa dele se a filha do governador estava debruçada sobre seu colo desconcentrando-o e que seu sócio estava no banco de trás adormecido e também sem cinto).

Ele não estaria perdido enquanto andasse pela estrada principal que sempre seguia quando ia e voltava do trabalho.

Estacou. Olhou o seu relógio de pulso Hype Desire que marcava 00:12 am, meteu a mão direita no bolso e apanhou o GPS que acompanhava o relógio... Estava a 6 milhas de casa e demoraria um tempo incrível e cansativo até seu destino. Riu-se quando ao continuar sua vasculha descobriu que o celular estava fora de área (mesmo sendo impossível um Magman 3441N, via satélite ficar fora de área!!!). Já havia andado várias quadras e nenhum sinal de telefone público funcionando. No entanto, nada temia enquanto tivesse sua Beretta 200ST carregada à suas costas.

Parou mais uma vez. No bolso do paletó, pegou uma carteira de cigarros Gauloises e com ela levou um à sua boca. Rapidamente trocou de item em seu bolso: carteira de cigarros por isqueiro Órion (um pequeno orbe com um botão e um furo pequenino) e acendeu o tabaco enrolado em seus lábios.

Notou que ao seu lado havia um beco tomado pela escuridão.
Deu alguns passos à frente − continuando sua jornada ainda observando o lugar (uma sensação esparzia de lá e era de uma natureza mais sórdida que a indiferença e ceticismo de Robert) - quando esbarrou em algo.

Antes de olhar sua primeira reação foi jogar o braço direito para trás à procura da arma, fazendo – com o movimento – o paletó aberto esvoaçar. Mas o quando procurou a origem do choque... O que ele viu quase o fez perder os sentidos: tinha a sua altura, quatro membros, um tronco e uma cabeça. 
Mas no lugar de pele havia uma massa de carne, sangue, músculos, pústulas e órgãos que se retorciam e regurgitavam um líquido grosso e alaranjado em todas as direções, levantou o que deveria ser seu braço direito e algo que se assemelhava uma mão viscosa e cheia de muco estendeu-se em sua direção, ao mesmo tempo em que buracos que de tão forçados eram rasgados onde deveria existir uma boca soltava grunhidos gorgolejantes, aquosos e pavorosos.

Movimentava-se em sua direção vagarosamente enquanto nacos de carne viva desgarravam-se do seu corpo e um Robert apavorado recuava vasculhando os recônditos de sua mente à procura de algum conhecimento que o explicasse o que significava aquilo. 
Na fração de segundos em que ele constatou que aquela coisa era “Um-Algo-Desconhecido-E-Por-Isso-Deveria-Ser-Destruído” começou a atirar. Sua bela Beretta prateada a cada segundo cuspia de 3 projéteis em partes diferentes da coisa maldita que se aproximava.

A cada segundo 15 U$ eram fincados no corpo da criatura monstruosa. Entretanto, para o desespero do homem de negócios bem sucedido de Ohio, o monstro não tombara, prosseguia enquanto ele próprio ficava semiparalisado pelo medo.

Não. Não podia ficar parado. O que quer que fosse aquilo era indestrutível e o faria mal, com certeza!

Tinha que fugir. E olhou em volta... E vomitou. 

Os prédios, o chão, os postes... Tudo tinha a aparência e a textura animalesca, fétida e purulenta do monstro que o oprimia. Cabeças sem pele surgiam da pasta borbulhante de carne e músculos que era agora o universo que o rodeava. Várias criaturas que pareciam paródias de pessoas familiares eram cuspidas do que deveria ser o solo, mas agora era um rio grosso de restos humanos. Elas expeliam como se fosse excremento órgãos genitais de todas as partes possíveis em jorros de vômito e sangue.

Era uma loucura nauseabunda. Ele via dólares aqui e ali e achava estar vivendo uma alucinação. A essa altura já estava caído no que deveria ser o chão... E o primeiro monstro de carne que vira anteriormente agora estava montado sobre seu corpo, rasgando seu caríssimo Di Giorgio, arrancado a superficialidade que o cobria... Réplicas funestas de genitais – tanto masculinos quanto femininos – apareciam e desapareciam, brotando dos filamentos musculares da criatura em profusa viscosidade, fazendo-o engulhar e ter espasmos convulsivos...

Inúmeras vezes fora estuprado e corrompido... Não sabia mais quem era ou o que era, mas algo naquilo tudo, naquela orgia demoníaca o fazia lembrar-se dos seus pecados e ao invés de desespero, medo ou remorso ele sentia uma ira insana... E quanto maior a sua ira, maior eram as perversidades que o acometiam.

Já há algum tempo havia perdido a vergonha de urinar e defecar em si próprio.  Há muito que seu suor misturava-se às fezes, urina e aos líquidos pegajosos que brotavam das coisas que pareciam feridas vivas! Ele não era mais ele.

Não era mais nada. Não era, só sentia. Física e mentalmente... E no fundo sabia que ele era culpado de tudo.

Antes de aquilo acontecer ele até acreditava no diabo e em Deus – mas não dava muita atenção para os dois. Agora não sabia mais... Na verdade bem o sabia. Clamou por Ele várias vezes, mas Ele... Não respondeu.

•       •       

Ruzziel, não achas que exageras? – uma voz firme e imparcial se fazia ouvir.
Não. Esta é a minha lei. Esta é minha punição. – Ruzziel falava num tom suave e aliviante.

Ambos, Guardião e Arcanjo, examinavam o sofrimento do Mr. Robert Stoneshoulders.

Sugeres que tal alma mereça essa agonia? – Tornou a primeira voz.
O caminho dele não seria o inferno. – era Ruzziel

Seria o purgatório. Eu sei. Lá seria um ótimo lugar para arrepender-se, não achas?
Ofaramir, Arcanjo da piedade, sei que também defendes a inflexibilidade. – O Guardião mais uma vez.

Sim – Ofaramir concordava.
O Todo Poderoso me deu o aval. Este homem a quem eu protegi por todos esses 25.654 dias é um tocado pelo inferno. Se ele for ao Purgatório terá talentos e lábia o suficiente para convencer qualquer executor... Em menos de meia eternidade ele estaria onde não deveria estar: ao lado do Altíssimo. – Argumentava Ruzziel com não mais que uma sugestão de ira na face.

Entendo. Ele tem o que nós não temos e é um dos tantos que o usa de forma indigna, não? – era Ofaramir.

O Nosso Grandioso Pai Celestial não os pune por que os ama com sua Infinita Bondade – o anjo fez uma pausa e depois de um suspiro aborrecido prosseguiu –, mas eu não os amo. Não mais. A Justiça d´Ele chegará no dia do Juízo Final. Faço a minha agora; enquanto ele permitir.

Mas seu primeiro ato de justiça... É logo com quem dedicastes a maior parte de seus ímpetos para defender! Não tens receio do Julgo d´O Santíssimo vir para ti? Não tens medo de cair? – exclamou questionador, o Arcanjo.

Não. Não temo qualquer Julgo. Estou corrigindo um erro, Ofaramir. Errar é humano... – e enquanto uma lágrima escorria pela face do anjo Ruzziel ele seguiu dizendo – Não sou humano.


Olhavam por entre Os Remorsos Pecaminosos de Robert Stoneshoulders enquanto este sucumbia.


#PHPoemaday

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